Na última publicação, havia sido dito que o próximo post seria sobre um artigo de David Hirshleifer, Angie Low e Siew Hong Teoh, chamado "Are Overconfident CEOs Better Innovators?", publicado no Journal of Finance. Entretanto, a análise crítica deste material ainda não será publicada hoje mas, sim, no futuro. O motivo deste ajuste é o texto sobre Governança Corporativa de Andrew Shleifer e Robert W. Vishny, conforme citação bibliográfica abaixo:
SHLEIFER, A. & VISHNY, R.W. 1997. A survey of corporate governance. JOURNAL OF FINANCE 52(2):737-783.
Como o título sugere, é uma ampla pesquisa sobre Governança Corporativa. Aliás, uma excelente obra que recomendo como leitura obrigatória para qualquer um interessado no assunto.
Todo o artigo é muito bom, porém um pedaço específico me chamou demais a atenção e, por isso, será aqui transcrito, em tradução livre de quem vos escreve.
Qualquer semelhança com nosso país, que não é citado no texto, não é mera coincidência.
páginas 767-768
"Cooperativas e Propriedade Estatal
Nós sugerimos que, em algumas situações, concentração de propriedade pode não ser ótimo porque os stakeholders que não são shareholders, como administradores, empregados e consumidores são deixados com poucos benefícios [...] Por exemplo, firmas privadas com grandes investidores podem não proporcionar qualidade suficiente ou enganar os stakeholders da firma devido a seu foco exclusivo nos lucros. Essa lógica tem sido usada para explicar porque planos de saúde, escolas infantis e até estabelecimentos varejistas são às vezes melhor oferecidos por cooperativas, incluindo cooperativas de consumidores. Ao votar pelos preços e pela qualidade, os stakeholders conseguem um resultado melhor do que seria com um proprietário com foco na maximização dos lucros.
Um argumento similar tem sido usado para justificar a propriedade estatal de firmas. Quando há poder monopolizado, externalidades, ou probemas de distribuição de renda, as firmas privadas com foco em maximização de lucros podem falhar em lidar com estas questões. Um político "publicly spirited) (publicly spirited politician, no original), pode então melhorar a eficiência ao controlar as decisões da firma. Tal argumento de bem-estar social é subjacente ao caso tradicional de propriedade estatal de ferrovias, eletricidade, prisões, escolas, saúde pública e muitas outras atividades (Laffont e Tirole (1993), Sappington e Stiglitz (1987)). Versões deste argumento são usadas para justificar a propriedade estatal de indústrias também.
Com algumas exceções de atividades onde a argumentação sobre propriedade estatal "é vencedora" (carries the day, no original), como a polícia e as prisões (Hart, Shleifer e Vishny (1997)), a realidade da propriedade estatal é amplamente inconsistente com este argumento de eficiência. Primeiro, firmas estatais não parecem servir ao interesse público melhor que as firmas privadas. Por exemplo, em muitos países as empresas estatais são mais poluidoras que as firmas privadas. De fato, os problemas de poluição são mais severos nos países ex-comunistas (former communist, no original) que foram dominados por firmas estatais (Grossman e Krueger (1993)). Segundo, contrário ao que diz a teoria, as firmas estatais são tipicamente extremamente ineficientes (tipically extremely inneficient, no original), e suas perdas resultam em enormes despesas nos tesouros de seus países (Kikeri, Nellis e Shirley (1992) e Boycko, Shleifer e Vishny (1995) pesquisam a evidência relevante). Em sua frequente desconsideração por objetivos sociais, além de sua extrema ineficiência, o comportamento das firmas estatais é inconsistente com a justificativa de eficiência para sua existência.
A visão da governança corporativa tomada neste artigo ajuda a explicar os principais elementos do comportamento das firmas estatais. Enquanto na teoria essas firmas são controladas pelo público, o controle de facto pertence aos burocratas. Esses burocratas podem ser pensados como possuindo direitos de controle extremamente concentrados, porém sem direitos a fluxos de caixa significantes, porque a propriedade dos fluxos de caixa da firma é efetivamente dispersada entre os pagadores de impostos do país. Além do mais, os burocratas tipicamente têm objetivos próprios que são muito diferentes do bem-estar social, e são ditados por interesses políticos (Shapiro e Willig (1990), Boycko et al (1996), Shleifer e Vishny (1997). Em resumo, os burocratas que controlam as firmas estatais têm, at best, apenas uma preocupação indireta com os lucros (porque os lucros fluem para o orçamento do governo), e têm objetivos que são muito diferentes do interesse social. No entanto, eles têm virtualmente poder completo sobre essas firmas, e podem dirigi-las para perseguir qualquer objetivo político. Propriedade estatal é então um exemplo de controle concentrado sem direitos a fluxos de caixa e com objetivos socialmente prejudiciais. Vistas desta perspectiva, a ineficiência das firmas estatais não é surpreendente.
O reconhecimento da enorme ineficiência das firmas estatais, e as pressões sobre os orçamentos públicos, têm criado uma resposta comum around the world nos últimos anos, chamada privatização."



