Caros leitores, boa tarde.
Peço
desculpas pela falta de novas publicações, garantindo não ser por falta
de conteúdo interessante para ser compartilhado mas, sim, por falta de
tempo.
Para não deixar o blog abandonado, será postado aqui algo mais sociológico, uma parte de um dossiê que fiz para a disciplina de Teorias Organizacionais. Antes de cursar essa incrível "cadeira" na UFRGS, não conhecia este tremendo autor.
Alberto Guerreiro Ramos foi um sociólogo brasileiro bastante influente, um autor incrível, tendo sido respeitado até mesmo em universidades estadunidenses. Esta seção é referente a 3 capítulos do trabalho de Guerreiro Ramos em sua obra "A Nova Ciência das Organizações", conforme citação bibliográfica abaixo.
RAMOS, Alberto Guerreiro. A Síndrome comportamentalista; Política cognitiva; Teoria da delimitação dos sistemas sociais. In: ______. A Nova ciência das organizações: uma reconceituação da riqueza das nações. 2. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1989. Cap. 3, p. 50-68; Cap. 5, p. 86-117; Cap. 7, p. 140-154.
Espero que seja desfrutada esta leitura e recomendo atenção para as diferenças propostas pelo autor para os conceitos de comportamento e ação, e também para a definição de "homem bom".
"[...] Neste dossiê escolheu-se tratar sobre Alberto Guerreiro Ramos e alguns de seus textos presentes em “A Nova Ciência das Organizações”.
No primeiro capítulo, trata-se sobre o assunto da síndrome comportamentalista. Ramos inicia a discussão com o argumento de que a maior parte do “que é usualmente denominado teoria da organização é desprovida de rigor científico” e que esta “considera como normais e naturais os requisitos organizacionais tal como, por acaso, são encontrados sobrepondo-se à conduta humana como um todo” (1989, p. 50).
Para o autor, deve-se distinguir os termos comportamento e ação, sendo que o primeiro seria uma forma de conduta baseada na racionalidade funcional, e o segundo significando uma forma ética de conduta, (1989, p. 51) “própria de um agente que delibera sobre coisas porque está consciente de suas finalidades intrínsecas”. Guerreiro Ramos declara então que “a síndrome comportamentalista, isto é, a ofuscação do senso de critérios adequados de modo geral à conduta humana, tornou-seuma característica básica das sociedades industriais contemporâneas” (1989, p. 52).
Existem quatro traços principais desta síndrome. O primeiro é a fluidez da individualidade, ligado à ideia de que a conduta humana se conforma a critérios utilitários; “criados pelo homem, os valores não são “perpétuos, imutáveis e inequívocos, a natureza humana é fraca e inconstante” (HAUSER apud RAMOS, 1989, p. 53). O segundo é o perspectivismo, um tipo peculiar de conduta, onde o homem só leva em conta “as conveniências exteriores, os pontos de vista alheios e os propósitos em jogo” (RAMOS, 1989, p. 57).
O terceiro aspecto é o formalismo, “onde a observância das regras substitui a preocupação pelos padrões éticos substantivos” (1989, p. 59) e, finalmente, o quarto é o operacionalismo positivista, “permeado de uma orientação controladora do mundo” que induz pesquisadores a “enfocar seus aspectos suscetíveis de controle” (1989, p. 63). Segundo o autor, o operacionalismo é deturpado em sua identificação do útil com o verdadeiro, defendendo que despojaram a utilidade de seu caráter eticamente ambíguo, legitimando como normas gerais aquilo que é útil ao sistema social para o controle dos seres humanos que dele participam” (1989, p. 65).
No segundo capítulo proposto, Alberto G. R. descreve a política cognitiva como um instrumento que garante à atual teoria organizacional sua hegemonia, dizendo que o “uso consciente ou inconsciente de uma linguagem distorcida, cuja finalidade é levar as pessoas a interpretarem a realidade em termos adequados aos interesses dos agentes diretos e/ou indiretos de tal distorção” (1989, p. 87). A retórica então, constituiria uma técnica “para adular a multidão e a ser usada perante aqueles que não têm o hábito de pensar, uma vez que o retórico sofístico não pode ser convincente entre os que possuem sabedoria” (PLATÃO apud RAMOS, 1989, p. 87).
Para Guerreiro, a política cognitiva “é a moeda corrente psicológica da sociedade centrada no mercado” (1989, p. 90). O autor (1989, p. 91) é tão incipiente em sua interpretação da realidade que faz afirmações relativamente atuais, tomando-se em conta a época em que os textos foram escritos:
Os agentes da política cognitiva se diferenciam, no grau de percepções de seus papéis. Os mais conscientes deles encontram-se, geralmente, nas atividades de comunicação e publicidade. A imprensa, o rádio e a televisão estão, conjuntamente, engajados num processo contínuo de deliberada definição da realidade. Os instrumentos da mídia são utilizados como armas na competição para influenciar a interpretação que o povo dá à realidade. [...]. Uma hora de televisão é suficiente para que qualquer um perceba que a política de cognição é um fato preponderante da vida contemporânea.
Numa sociedade de mercado, o empregado eficiente deve ser um ator despersonalizado, segundo Ramos (1989, p. 98). Esta exigência se configura em verdade conflito, permanente e inevitável, somente podendo ser eliminado pela “morte do ser humano ou por sua paralisia” (1989, p. 100). A chamada deformação da pessoa humana “tem sido o preço psicológico” (1989, p. 107).
No terceiro e último capítulo proposto, Guerreiro Ramos apresenta seu modelo multidimensional, em contrapartida ao modelo tradicional, tido como unidimensional, no sentido de focar-se apenas no mercado. Na abordagem guerreirista, o homem está inserido em uma realidade multicêntrica, com diversos enclaves (o mercado é apenas um deles).
Neste paradigma, chamado de paraeconômico, existe uma orientação individual, além da comunitária. Em uma abordagem unidimensional, “reduzem o indivíduo, ou cidadão, a um agente da maximização da utilidade, permanentemente ocupado em atividades de comércio” e no modelo multidimensional, “só incidentalmente o indivíduo é maximizador da utilidade e seu esforço básico é no sentido da ordenação de sua existência de acordo com as próprias necessidades de atualização pessoal” (RAMOS, 1989, p. 141).
Também há uma prescrição contra a ausência de normas. Não que o autor defenda um ambiente altamente normatizado; “nos sistemas sociais que visam maximizar a atualização pessoal, as prescrições não são eliminadas. São mínimas” (1989, p. 145). Para Ramos, a total eliminação das prescrições e das normas seria incompatível com uma significativa atualização humana, no contexto do mundo social, porém defendendo que um ambiente superorganizado não permite que um indivíduo disponha das condições para uma vida pessoal criativa, complementando que “preso continuamente a uma trama de exigências sobre método e organização, o indivíduo acaba por aceitar uma visão predeterminada da realidade” (1989. p. 145).
Existem algumas categorias que delimitam o paradigma paraeconômico. A anomia é conceituada como uma situação estanque, em que a vida pessoal e social desaparece, em uma ausência de normas. O motim é a referência de coletividades desprovidas de normas. A isonomia é um contexto em que todos os membros são iguais entre si. Já a fenonomia é um sistema social de caráter esporádico, “iniciado e dirigido por um indivíduo, ou por um pequeno grupo, e que permite a seus membros o máximo de opção pessoal e um mínimo de subordinação a prescrições formais” (RAMOS, 1989, p. 152). A última categoria é o ator isolado, aquele que está excessivamente comprometido com uma norma que, para ele, é única. Este encontra um “canto em que, de forma consistente, pode viver de acordo com seu peculiar e rígido sistema de crença”, considerando o mundo social, como um todo, “inteiramente incontrolável e sem remédio” (1989, p. 153)."
Para não deixar o blog abandonado, será postado aqui algo mais sociológico, uma parte de um dossiê que fiz para a disciplina de Teorias Organizacionais. Antes de cursar essa incrível "cadeira" na UFRGS, não conhecia este tremendo autor.
Alberto Guerreiro Ramos foi um sociólogo brasileiro bastante influente, um autor incrível, tendo sido respeitado até mesmo em universidades estadunidenses. Esta seção é referente a 3 capítulos do trabalho de Guerreiro Ramos em sua obra "A Nova Ciência das Organizações", conforme citação bibliográfica abaixo.
RAMOS, Alberto Guerreiro. A Síndrome comportamentalista; Política cognitiva; Teoria da delimitação dos sistemas sociais. In: ______. A Nova ciência das organizações: uma reconceituação da riqueza das nações. 2. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1989. Cap. 3, p. 50-68; Cap. 5, p. 86-117; Cap. 7, p. 140-154.
Espero que seja desfrutada esta leitura e recomendo atenção para as diferenças propostas pelo autor para os conceitos de comportamento e ação, e também para a definição de "homem bom".
"[...] Neste dossiê escolheu-se tratar sobre Alberto Guerreiro Ramos e alguns de seus textos presentes em “A Nova Ciência das Organizações”.
No primeiro capítulo, trata-se sobre o assunto da síndrome comportamentalista. Ramos inicia a discussão com o argumento de que a maior parte do “que é usualmente denominado teoria da organização é desprovida de rigor científico” e que esta “considera como normais e naturais os requisitos organizacionais tal como, por acaso, são encontrados sobrepondo-se à conduta humana como um todo” (1989, p. 50).
Para o autor, deve-se distinguir os termos comportamento e ação, sendo que o primeiro seria uma forma de conduta baseada na racionalidade funcional, e o segundo significando uma forma ética de conduta, (1989, p. 51) “própria de um agente que delibera sobre coisas porque está consciente de suas finalidades intrínsecas”. Guerreiro Ramos declara então que “a síndrome comportamentalista, isto é, a ofuscação do senso de critérios adequados de modo geral à conduta humana, tornou-seuma característica básica das sociedades industriais contemporâneas” (1989, p. 52).
Existem quatro traços principais desta síndrome. O primeiro é a fluidez da individualidade, ligado à ideia de que a conduta humana se conforma a critérios utilitários; “criados pelo homem, os valores não são “perpétuos, imutáveis e inequívocos, a natureza humana é fraca e inconstante” (HAUSER apud RAMOS, 1989, p. 53). O segundo é o perspectivismo, um tipo peculiar de conduta, onde o homem só leva em conta “as conveniências exteriores, os pontos de vista alheios e os propósitos em jogo” (RAMOS, 1989, p. 57).
O terceiro aspecto é o formalismo, “onde a observância das regras substitui a preocupação pelos padrões éticos substantivos” (1989, p. 59) e, finalmente, o quarto é o operacionalismo positivista, “permeado de uma orientação controladora do mundo” que induz pesquisadores a “enfocar seus aspectos suscetíveis de controle” (1989, p. 63). Segundo o autor, o operacionalismo é deturpado em sua identificação do útil com o verdadeiro, defendendo que despojaram a utilidade de seu caráter eticamente ambíguo, legitimando como normas gerais aquilo que é útil ao sistema social para o controle dos seres humanos que dele participam” (1989, p. 65).
No segundo capítulo proposto, Alberto G. R. descreve a política cognitiva como um instrumento que garante à atual teoria organizacional sua hegemonia, dizendo que o “uso consciente ou inconsciente de uma linguagem distorcida, cuja finalidade é levar as pessoas a interpretarem a realidade em termos adequados aos interesses dos agentes diretos e/ou indiretos de tal distorção” (1989, p. 87). A retórica então, constituiria uma técnica “para adular a multidão e a ser usada perante aqueles que não têm o hábito de pensar, uma vez que o retórico sofístico não pode ser convincente entre os que possuem sabedoria” (PLATÃO apud RAMOS, 1989, p. 87).
Para Guerreiro, a política cognitiva “é a moeda corrente psicológica da sociedade centrada no mercado” (1989, p. 90). O autor (1989, p. 91) é tão incipiente em sua interpretação da realidade que faz afirmações relativamente atuais, tomando-se em conta a época em que os textos foram escritos:
Os agentes da política cognitiva se diferenciam, no grau de percepções de seus papéis. Os mais conscientes deles encontram-se, geralmente, nas atividades de comunicação e publicidade. A imprensa, o rádio e a televisão estão, conjuntamente, engajados num processo contínuo de deliberada definição da realidade. Os instrumentos da mídia são utilizados como armas na competição para influenciar a interpretação que o povo dá à realidade. [...]. Uma hora de televisão é suficiente para que qualquer um perceba que a política de cognição é um fato preponderante da vida contemporânea.
Numa sociedade de mercado, o empregado eficiente deve ser um ator despersonalizado, segundo Ramos (1989, p. 98). Esta exigência se configura em verdade conflito, permanente e inevitável, somente podendo ser eliminado pela “morte do ser humano ou por sua paralisia” (1989, p. 100). A chamada deformação da pessoa humana “tem sido o preço psicológico” (1989, p. 107).
Alberto Guerreiro Ramos
No terceiro e último capítulo proposto, Guerreiro Ramos apresenta seu modelo multidimensional, em contrapartida ao modelo tradicional, tido como unidimensional, no sentido de focar-se apenas no mercado. Na abordagem guerreirista, o homem está inserido em uma realidade multicêntrica, com diversos enclaves (o mercado é apenas um deles).
Neste paradigma, chamado de paraeconômico, existe uma orientação individual, além da comunitária. Em uma abordagem unidimensional, “reduzem o indivíduo, ou cidadão, a um agente da maximização da utilidade, permanentemente ocupado em atividades de comércio” e no modelo multidimensional, “só incidentalmente o indivíduo é maximizador da utilidade e seu esforço básico é no sentido da ordenação de sua existência de acordo com as próprias necessidades de atualização pessoal” (RAMOS, 1989, p. 141).
Também há uma prescrição contra a ausência de normas. Não que o autor defenda um ambiente altamente normatizado; “nos sistemas sociais que visam maximizar a atualização pessoal, as prescrições não são eliminadas. São mínimas” (1989, p. 145). Para Ramos, a total eliminação das prescrições e das normas seria incompatível com uma significativa atualização humana, no contexto do mundo social, porém defendendo que um ambiente superorganizado não permite que um indivíduo disponha das condições para uma vida pessoal criativa, complementando que “preso continuamente a uma trama de exigências sobre método e organização, o indivíduo acaba por aceitar uma visão predeterminada da realidade” (1989. p. 145).
Existem algumas categorias que delimitam o paradigma paraeconômico. A anomia é conceituada como uma situação estanque, em que a vida pessoal e social desaparece, em uma ausência de normas. O motim é a referência de coletividades desprovidas de normas. A isonomia é um contexto em que todos os membros são iguais entre si. Já a fenonomia é um sistema social de caráter esporádico, “iniciado e dirigido por um indivíduo, ou por um pequeno grupo, e que permite a seus membros o máximo de opção pessoal e um mínimo de subordinação a prescrições formais” (RAMOS, 1989, p. 152). A última categoria é o ator isolado, aquele que está excessivamente comprometido com uma norma que, para ele, é única. Este encontra um “canto em que, de forma consistente, pode viver de acordo com seu peculiar e rígido sistema de crença”, considerando o mundo social, como um todo, “inteiramente incontrolável e sem remédio” (1989, p. 153)."


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